Existe um fenômeno linguístico que faz parte do nosso dia a dia, mas que passa em branco para muitos: trata-se do estrangeirismo. Muito polêmico, ele ocorre quando pegamos emprestado algumas palavras ou termos de outros idiomas e os usamos no nosso.

O estrangeirismo é considerado polêmico, pois os gramáticos ainda não entraram em um acordo: alguns o consideram uma composição de palavras, já outros, uma figura de linguagem, enquanto os mais conservadores o veem como algo nocivo, um vício de linguagem, que inclusive deve ser evitado. Alguns desses conservadores inclusive o chamam de barbarismo, numa clara referência aos povos bárbaros, que invadiam cidades para saqueá-las. Um pouco extremo demais, não?

De qualquer forma, bem aceito ou não, o estrangeirismo existe e está dividido em duas categorias: com ou sem aportuguesamento. Isto é, algumas palavras chegaram aqui e acabaram ganhando ares tupiniquins e foram reescritas seguindo os preceitos da nossa gramática. Por exemplo: até a reforma ortográfica de 2009, as letras K, Y e W não eram reconhecidas oficialmente no português, então muitas palavras que as traziam foram reescritas para dar vez às letras similares, como C ou I (como em caubói). Já outras não sofreram qualquer modificação, sendo apenas reconhecidas e incorporadas ao idioma, mesmo que ainda sejam sinalizadas como estrangeiras.

(Imagem: Freepik)
A verdade é que, querendo os conservadores ou não, o estrangeirismo fez, faz e sempre fará parte da nossa língua. Isso não é exclusividade do português: caipirinha, por exemplo, já é reconhecida na Inglaterra; o inglês também reconhece e usa résumé ou fiancée, que vêm do francês, e significam currículo e noivo/noiva, respectivamente. Veja, na prática, como o estrangeirismo está inserido definitivamente no nosso meio:

“Vida de designer não é fácil. Precisei sair do happy hour mais cedo por causa de um freela complexo. O briefing era tão grande que deletou parte das minhas ideias pré-definidas. Agora, cá estou eu: no escuro, porque meu abajur queimou, usando um jeans surrado, com uma xícara de cappuccino e um pedaço de pizza de ontem no prato, torcendo para que o leiaute do site saia conforme o pedido. Pelo jeito, vou ter que sacrificar o futebol do fim de semana”.

Apenas nesta estorinha, por exemplo, há vários exemplos de estrangeirismo, aportuguesado ou não. Alguns são bem fáceis de adivinhar, enquanto outros nos pegam de surpresa. Confira esses e outros mais:

  • Designer

Derivada do inglês e já reconhecida pela ABL (Academia Brasileira de Letras), ainda que apontada como estrangeira;

  • Happy hour

Vem do inglês também. Ainda não é reconhecido na nossa gramática, mas nem precisamos dizer que faz parte do nosso dia a dia;

  • Freela

Forma encurtada do inglês freelancer, que determina um profissional sem vínculo empregatício com uma empresa, mas que presta serviços a ela. O termo é muito usado na área de comunicação, mesmo que ainda não seja reconhecido pela gramática;

  • Briefing

Reconhecido como vocábulo estrangeiro pela ABL, é uma espécie de documento da publicidade com diretrizes sobre como um trabalho deve ser feito. É um estrangeirismo derivado do inglês.

  • Deletar

Durante anos, seu uso era desencorajado, mas não teve jeito: acabou entrando para nosso dicionário e até teve sua definição aportuguesada, pois não é mais indicada como palavra estrangeira, apesar de sua origem na língua inglesa.

  • Abajur

Essa vem do francês, e sofreu um claro aportuguesamento, pois, em sua língua mãe, ela é escrita “abat-jour”.

  • Jeans

O mercado do jeans é um dos mais populares no Brasil, porém demorou bastante tempo para que a gramática aceitasse a palavra, que ainda é considerada como estrangeira.

  • Cappuccino

Dá para acreditar que, mesmo com todo mundo sabendo a que se refere e sendo usada diariamente, a ABL ainda não a reconheceu? Vem do italiano e, segundo a lenda, originou-se na ordem dos capuchinhos, monges franciscanos que usam capuz e roupa marrom (cappuccino, inclusive, significa “capuz pequeno”).

  • Pizza

Não precisamos falar nada, né? Italianíssima, a palavra já consta no nosso dicionário, porém ainda é descrita como estrangeira, ou seja, não foi aportuguesada (ainda bem, porque do jeito que eles são, é capaz que inventem uma tal de “pitssa”).

  • Leiaute

Estranhou? Mais estranho será quando você descobrir que a ABL reconhece as duas formas: essa mais feia, aportuguesada, e a original inglesa, mais popular (layout), apontada como estrangeira.

  • Site

Talvez o mais conhecido entre os estrangeirismos, nosso dicionário já o reconhece, porém como uma palavra estrangeira, derivada do inglês.

  • Futebol

Surpreso? Lembre-se de que o esporte, apesar de ser automaticamente associado ao Brasil, nasceu na Inglaterra, então seu nome também veio de lá (football). Podemos até arriscar em dizer que, entre todos os estrangeirismos, o futebol tenha sido mais rápido a ser reconhecido e aportuguesado, graças à popularidade do esporte.

  • Impeachment

Nos últimos anos, essa palavrona da língua inglesa voltou a fazer parte do nosso cotidiano. Reconhecida pelo dicionário como uma palavra estrangeira, ela significa “impugnação”, “impedimento”.

  • Réveillon

Usamos todos os anos (inclusive, ele está chegando! \o/) e muitos não sabem que ela deriva do francês, significa “acordar de novo” e já faz parte do nosso dicionário, porém sem ser aportuguesada.

Claro que essas não são as únicas. Nosso idioma tem, aproximadamente, 435.000 verbetes reconhecidos, e grande parte deles têm origem estrangeira. Ainda faltou falarmos do xampu, show, bangalô, batom, carrossel, champanhe, debutar, metrô e tantas outras. Enfim, o estrangeirismo não deve ser encarado como um vilão que deve ser derrotado, sob ameaça de acabar com nosso idioma. Pelo contrário, ele veio para enriquecê-lo ainda mais.

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